Necesidades da criança en idade pre-escolar (Portugués)
1. Introdução
É fundamental estudar a criança
com a profundidade necessária, o que por vezes É negligenciado,
especialmente no momento em que se assume em termos sócio-políticos
a obrigatoriedade da Educação PrÉ-Escolar, um dos
indicadores mais baixos do sistema educativo português, pois só
50 % das crianças portuguesas são por ela cobertas.
Em termos antropológicos e
filogenÉticos, a criança É o pai do adulto, daí
a importância da sua educação e formação
(FONSECA 1989).
A nossa experiência de 25 anos
no âmbito clínico, exactamente com crianças com problemas
de desenvolvimento e de aprendizagem, reforça o papel da educação
prÉ-escolar na prevenção do insucesso escolar e do
insucesso experencial, para alÉm de se constituir como um dos processos
de socialização que mais pode contribuir para a diminuição
das desigualdades sociais.
Quase toda a gente avança com
imensos conceitos sobre o papel da educação prÉ-escolar,
desde estudiosos a pais, desde professores a políticos, mas na
essência nuclear dos mesmos, estamos muito próximos do provÉrbio
"todos falam mas ninguÉm tem razão". A coerência de
tais conceitos, a profundidade das sínteses conteudísticas
apresentadas em vários artigos de revista ou na mass-mÉdia,
e de certa forma, a carência de uma metateoria sobre o desenvolvimento
da criança em idade prÉ-escolar, É habitualmente
acompanhada de uma exiguidade de informação empírica,
não oferecendo no seu conjunto uma perspectiva biopsicosocial que
nos permita desenhar um cúrriculo psicoeducacional abrangente e
de qualidade para a educação prÉ-escolar (BADIAN
1982).
Tal perspectiva sistÉmica e
holística das necessidades de desenvolvimento deverá envolver
objectivamente uma visão multicomponencial, multiexperencial e
multicontextual da criança (STERNBERG 1985). Multicomponencial,
porque centrada na própria criança como ser complexo em
desenvolvimento, envolvendo a simultânea contiguidade de componentes
em co-interacção, desde as psicomotoras, às psicolinguísticas,
desde as cognitivas às sócio-emocionais. Multiexperencial,
porque decorrente da qualidade das oportunidades de desenvolvimento encaradas
sobre a frequência da sua habituação ou generalização.
Multicontextual, porque resultantes da adaptabilidade e adequabilidade
dos contextos às características únicas, totais e
evolutivas da criança em idade prÉ-escolar, período
crítico de maturação neurológica e de transição
de processos de aprendizagem prÉ-simbólicos para os simbólicos.
É importante ter a noção
que a criança É uma história dentro de outra história,
uma filogenÉtica, portanto da espÉcie humana, dentro duma
ontogenÉtica, portanto da própria criança (FONSECA
1989, 1975).
A totalidade do organismo da criança
encerra em termos evolutivos uma noção de integridade, que
em última análise depende da organização sináptica
dos seus sistemas e subsistemas de aprendizagem, principalmente os que
preparam os prÉ-requisitos das funções neuropsicológicas
que estarão envolvidas nas aprendizagens escolares da leitura,
da escrita, do cálculo e da resolução de problemas
(GESCHIND & LEVITSKY 1968, KOLB & WISHAW 1986).
As necessidades da criança
na idade prÉ-escolar, colocam dois tipos de problemas. O primeiro,
É o que ela precisa efectivamente para se desenvolver para aprender
tarefas complexas, o segundo, É determinar qual É a missão
do sistema de ensino. Tal sistema deve preparar e tem de preparar, as
condições ecológicas educacionais específicas
que permitam a promoção dos prÉ-requisitos para aprender
funções simbólicas superiores, para que a criança
possa de facto, ter prazer, conforto e segurança no processo de
aprendizagem (JANSKY & deHIRSCH 1972).
No período da escolaridade
prÉ-primária, a criança tem concluída em termos
neuroevolutivos a mielinização das zonas crosso-modais e
das áreas sensório-motoras secundárias, quer posteriores
(parietais, occipitais e temporais) quer anteriores (frontais), e simultaneamente
já estão estruturadas as áreas de integração
e de processamento de informação que avançam consideravelmente
para a diferenciação dos sistemas de aprendizagem (ECCLES1989,
AJURIAGUERRA & SOUBIRAN 1959).
Será que a educação
prÉ-escolar proporciona condições de aprendizagem
que promovam o desenvolvimento global, total e evolutivo da criança?.
Qual a importância das aquisições dos 3, 4 e 5 anos
de idade, em relação com as aprendizagens ditas superiores
e simbólicas, como são a leitura, a escrita e o cálculo?.
Haverá uma proto ou uma prÉ-leitura, uma proto e uma prÉ-escrita,
um proto e um prÉ-cálculo?. Do ponto de vista do desenvolvimento
humano, o que É que os teóricos e os práticos de
educação prÉ-escolar têm como consenso em termos
de currículo? Que noções integradas, que metateorias
sobre o desenvolvimento da criança, têm todos os agentes
que directa ou indirectamente participam no processo, pais inclusivÉ?.
Quais são, de facto, as necessidades da criança em idade
prÉ-escolar?
2. - Necessidades da Criança
em Idade PrÉ-Escolar
Em termos pragmáticos, teremos
quatro áreas-chave a perspectivar:
- o desenvolvimento cognitivo;
- o desenvolvimento psicomotor;
- o desenvolvimento psicolinguístico;
e,
- o desenvolvimento sócio-emocional.
2.1. - Desenvolvimento Cognitivo
A 1ª área-chave quanto a nós,
será o desenvolvimento cognitivo. Será que É
importante ensinar as crianças a pensar? Será que É
fundamental estabelecer nas crianças, com tão pouca idade,
estratÉgias de resolução de problemas?
Em vez de ver a criança como
uma esponja em que os adultos debitam informação para que
ela depois a possa reproduzir de uma forma memorizada ou repetitiva, É
antes necessário ver a criança como um agente de assimilação
dinâmica (PIAGET 1947, 1962; FEUERSTEIN 1975), mais do que um receptor,
ela deve ser encarada como um gerador e um criador de conhecimentos, de
atitudes e competências e nunca um reprodutor de modelos adultos.
Como É que preparamos uma criança
de acordo com as suas multidimensões evolutivas?. Apenas para um
processo que É universal, que É aprender a ler, a escrever
e a contar ou tambÉm para um processo que É inovador, como
É aprender a pensar e aprender a aprender?.
Parece importante que precisamos de
um cúrriculo cognitivo para crianças na idade prÉ-escolar.
Que tipo de cúrriculos temos que possam promover e potenciar um
desenvolvimento desta função crucial da aprendizagem, que
tipo de prÉ-aptidões, de prÉ-requisitos temos que
implementar na educação prÉ-primária que permitam
à criança integrar as condições de processamento
de informação subdividido nas suas componentes de input,
integração-elabração e de output (STERNBERG
1985, DAS et al. 1979, HAYWOOD 1992, GARDNER 1985) que permitam aprender
posteriormente funções altamente complexas?.
Porque É que muitas crianças
com um potencial cognitivo normal que estão no 2º e 3º ano de escolaridade,
apresentam o mesmo perfil de dificuldades de aprendizagem que outras crianças
qiue frequentam o 1º ano de escolaridade?. Que condições,
quer na sociedade, quer na família e quer na comunidade educativa,
se têm proporcionado às crianças de tenra idade para
desenvolverem funções cognitivas fulcrais para as aprendizagens
simbólicas.
A urgência dum currículo
cognitivo para a criança em idade prÉ-escolar É hoje,
em plena sociedade cognitiva, uma das prioridades dos sistemas de ensino
modernos. Tal currículo deverá fornecer às crianças
condições onde os processos fundamentais para pensar e resolver
problemas sejam desenvolvidos, na medida em que a falta de preparação
para as aprendizagens simbólicas pode gerar dificuldades e bloqueios
no início a carreira escolar de muitas crianças, nomeadamente
crianças oriundas de meios desfavorecidos ou de grupos culturalmente
diferentes (FLAVELL 1993).
Muitas situações envolvimentais,
no sentido dos ecossistemas de BROFENBRENNER 1979, negam às crianças,
as oportunidades de mediatização para adquirirem funções
cognitivas básicas, daí o papel do currículo cognitivo
como instrumento eficaz de intervenção pedagógica
para reduzir e compensar diferenças sociais e subculturais, que
podem desvirtuar a "igualdade de oportunidades" logo no início
da carreira escolar de muitas crianças.
O currículo cognitivo deve
elevar as capacidades de aprendizagem a todas as crianças atÉ
ao nível das exigências cognitivas requeridas pelas aprendizagens
primárias, como sejam competências de atenção,
de processamento, de planificação e comunicação
da informação (LURIA 1965, 1975). Utilizado como meio preventivo
do insucesso na aprendizagem, o currículo cognitivo deve integrar
operações prÉ-cognitivas, cognitivas e meta-cognitivas,
que se prefigurem como prÉ-requisitos das aprendizagens simbólicas
e não apenas como produtos de aprendizagem decorrentes de debitação
de conteúdos ou repetição de habilidades.
Em síntese, o currículo
cognitivo deve proporcionar um conjunto de práticas que permitam
promover os vários componentes e contextos do acto mental, i.e.,
input-integração/elaboração-output.
De acordo com os períodos construtivos
da inteligência (PIAGET 1962), a escolaridade prÉ-escolar
corresponde como exclusivo ao pensamento prÉ-operacional,
onde a criança demonstra toda a sua intuição e paralelamente
toda a sua disponibilidade para introduzir estratÉgias de aprendizagem
por tentativas e erros, onde ela tende a revelar uma espÉcie de
egocentrismo quase radical, onde frequentemente É seduzida por
aparências.
É o momento
crucial da descoberta do símbolo no jogo e na linguagem, onde de
simples explorador a criança passa a um investigador persistente,
culminando com um poder de memória verbal já assinalável,
fazendo uso sistemático de mediatizações verbais
quer em lenga-lengas, quer em histórias, para as quais apresenta
disposições mágicas extrardinárias, sendo
o seu poder de linguagem próximo das 10.000 palavras, produzindo
frases cada vez mais prolongadas e gramaticalizadas, evocando mesmo uma
riqueza interactiva e conversacional deveras notável para a sua
reduzida dimensão experencial (BRUNER et al. 1966, ELLIOT 1971).
Tais condicionantes
do desenvolvimento intrínseco da criança prÉ-escolar,
são condições ideais para se introduzir um currículo
cognitivo que a ensine a pensar e a aprender a aprender (GARDNER 1991).
2.2. - Desenvolvimento
Psicomotor
A 2ª área-chave
É o desenvolvimento psicomotor, processo que encerra a questão
das relações recíprocas entre a motricidade e o psiquismo
e a fenomenologia das emoções. Será que são
questões importantes sob o ponto de vista de desenvolvimento da
criança?
Será que
a criança desenvolve, de acordo com vários autores (FONSECA
1976), um pensamento lógico e reflexivo antes de ter um pensamento
centrado na sua inteligência quinestÉsica e corporal que
a criança exibe permanente no jogo e na actividade lúdica?
Será que ela exibe na interacção com as outras crianças,
a sua competência corporal como processo crucial de aprendizagem?.
O que É
a atenção perante o mundo exterior, senão o domínio
postural e a auto-consciência da sua acção intencional
na manipulação de objectos e de situações?
Porque É que hoje se fala muito da dÉfices de atenção
na maioria das crianças? Temos consciência que essa atenção,
tem a ver com o corpo?. O que É ter uma postura de atenção
para uma criança prÉ-escolar? Será bem trabalhado
este controlo postural pelos agentes de educação prÉ-escolar?.
O que É a postura em termos neuroevolutivos?. Para que serve o
equilíbrio na criança em idade prÉ-escolar?. Será
que esse equilíbrio É fundamental para a criança
estar sentada na sala de aula e a uma certa distância captar informação
vinda de muitas fontes simultaneamente?. Será o controlo postural
na criança fundamental ao seu sistema de processamento de informação?
De acordo com
muitos autores do desenvolvimento psicomotor (WALLON 1925, 1932, 1934,
1956, 1969; AJURIAGUERRA 1974; AYRES 1978, 1979) a criança em idade
prÉ-escolar É caracteizada pela integração
e convergência simultânea de vários processos integrados
a saber:
- desenvolvimento
tónico-sinergÉtico, consubs-tanciado numa mais perfeita
modulação e maturação tónico-postural
e tónico-emocional verificada por uma redução da
hipotonia, por uma diminuição das paratonias e das sincinÉsias
em todas as expressões corporais globais, finas e emocionais da
criança;
- segurança
gravitacional, visível num melhor controlo postural, numa equilibração
estática mais económica quer unipedal quer dinâmica,
e essencialmente numa integração vestibular mais plástica,
conferinda à expressão da criança não só
graciosidade e exuberância, mas tambÉm maior poder de inibição
e regulação da acção;
- reconhecimento
posicional pessoal e espacial, demonstrado não apenas por uma
inequívoca dominância sensorial (exterceptores) e motora
(efectores), mas igualmente por uma melhor organização intra
e interhemisfÉrica que ilustra a especialização cerebral
e a potencialidade corporal necessárias para a criança prÉ-escolar
dispôr dos instrumentos neuropsicológicos de locação
e navegação espácio-temporal obviamente implicados
nas aprendizagens simbólicas da leitura, da escrita e do cálculo;
- somatognósia,
revelada numa melhor representação mental do corpo e do
Eu, confirmada num desenho do corpo mais pormenorizado e articulado no
todo-e-nas-partes, exibindo componentes grafomotores mais precisos, poderes
mimÉticos impressionentes, ecocinÉsias diferidas e projeccionais
mais perfeitas e melódicas;
- planificação
e organização práxica, enunciada numa organização
construtiva e elaborativa do gesto intencional, permitindo à criança
descobrir e transformar o mundo exterior, e por analogia, integrar a ontogÉnese
da sua aprendizagem singular e plural (FONSECA 1989, 1995).
2.3. - Desenvolvimento Psicolinguístico
A 3º área-chave compreende
o desenvolvimento psicolinguístico. Quais as competências
psicolinguísticas mais relevantes para a criança em idade
prÉ-escolar sob o ponto de vista da linguagem quer falada quer
escrita?. Será que a criança ouve, discrimina, identifica
e comprende auditivamente?. Quantas crianças na sala de aula ouvem,
mas não escutam, não registam, não reintregam, não
rechamam, nem expressam instrumentos verbais adequados?.
Quantas crianças parece que
ouvem mas imediatamente parece que a informação sai pelo
outro ouvido?, para não falar de muitas que vêm, mas não
escrutinam, nem observam, nem identificam, não investigam pormenores
numa imagem, nem detalhes em figuras que depois quando se confrontam com
as aprendizagens psíquicas superiores, tambÉm não
descodificam símbolos e muito menos os compreendem?.
A investigação neuropsicológica
em adultos com acidentes vasculares cerebrais tambÉm demonstra
que estes deixam de ler (alexias) e deixam de escrever (agrafias), parecendo
evocar a desintegração de sistemas funcionais que outrora
os materializavam?
Será que É importante
tambÉm ter esta visão disfuncional ou patológica
para compreender a maturação neuropsicomotora básica
para aprender?. Será que desenvolvemos os prÉ-requisitos
psicolinguísticos nesta idade tão fundamental?.
Porque É que a criança
que não aprende a ler, a escrever e a contar, apresenta habitualmente
dÉfices multifacetados no processo psicolinguístico?.
O problema É só dela
ou será que temos que ter em conta a promoção de
estratÉgias individualizadas de facilitação psicolinguística
para cada criança?.
Sabemos diagnosticar e observar as
competências psicolinguísticas a tempo para depois evitármos
efeitos linguísticos chamados "de bola de neve"?.
O potencial psicolinguístico
duma criança não depende só dos seus processos de
maturação neurolinguística, depende igualmente dos
processos de mediatização linguística que são
praticados no envolvimento familiar e no envolvimento escolar, onde certamente
os factores sócio-económicos e sócio-culturais assumem
um peso significativo (BERRY 1969, REYNELL.1980).
A prevenção que se pode
fazer na educação prÉ-escolar no âmbito dos
processos prÉ e pós-linguísticos, pode ser muito
mais rentável que os custos e as despesas que advÉm do insucesso
escolar posterior..
O desenvolvimento psicolinguístico
da criança prÉ-escolar É paralelo com um extraordinmário
avanço e complexidade no vocabulário, com uma produção
articulatória inteligível e quase perfeita em termos semântico-sintáxicos,
com marcadores, tempos de verbos correctos, pronomes, adjectivação
crescente, adverbitização perspicaz, etc.
Em termos psicolinguísticos
a criança idade prÉ-escolar tende a apresentar uma extensão
fraseológica refinada, com frases negativas e interrogativas mais
subtis, com construções passivas mais perfeitas (BLOOM &
LAHEY 1978).
Enfim o enriquecimento psicolinguístico
do seu 1º sistema simbólico: receptivo, integrativo, elaborativo
e expressivo está quase concluído e o seu poder de conversação
atinge um patamar evolutivo marcante.
Com tais requisitos a transição
do 1º para o 2º sistema simbólico, far-se-á com mais facilidade
e a aprendizagem da leitura, da escrita e do cálculo É então
possível (FONSECA 1984, 1987).
2.4. - Desenvolvimento Sócio-Emocional
Por último a 4ª área-chave,
comprende o desenvolvimento socio-emocional, outro aspecto muito
importante, sob o ponto de vista da concepção da criança
como ser singular intrapessoal) e plural (interpessoal). A criança
em termos totais e não em termos meramente sectoriais ou fragmentados,
tem de ser concebida em termos prospectivos globais, pois foi essa visão
que autores como AJURIAGUERRA 1974, BANDURA 1963, ERICKSON 1963, FREUD
1962, DOLL 1953), nos deixaram, e com que nós os educadores, temos
de construir um corpo teórico donde possam emergir currículos
prÉ-escolares adequados às necessidades sócio-emocionais
das crianças.
Neste contexto, precisamos de integrar
tambÉm as correntes ecológicas e biopsicosociais para perceber
o que É a criança prÉ-escolar e termos um consenso
sobre essa perspectiva de desenvolvimento, para a tempo podermos intervir,
para a tempo podermos prevenir e só depois, de facto, termos condições
para facilitar o potencial de aprendizagem na criança, concretizando
a missão da escola.
Neste aspecto, não podemos
deixar de focar a perspectiva que por vezes É relativamente esquecida
e que tem muito a ver com a questão que está associada com
a mielenização propriamente dita e com a maturação
dos sistemas neurofuncionais da criança. Independentemente de não
aprendermos com o coração, apesar de Aristóteles
ter pensado que seria aquele o orgão mais organizado do organismo,
a aprendizagem humana tem de dar à emoção um papel
mais essencial, dado que em termos evolutivos, na espÉcie pensante
como nos designamos, o sentimento contou e conta tanto como o pensamento
(GOLEMAN 1995).
As emoções foram sempre
sábias guias no longo percurso evolutivo, domesticá-las,
controlá-las, modulá-las, foi sempre não só
a razão da sobrevivência, mas a preparação
para o surgimento da civilização humana. Todas as emoções
são, na sua essência, impulsos para a acção,
planos básicos para lidar com as aprendizagens, pois preparam o
corpo para os tipos de resposta que elas exigem da criança, explicando
muitas vezes a razão dos bloqueios que ela demonstra, ou a disponibilidade
que ela revela, para aprender.
O desenvolvimento sócio-emocional
da criança em idade prÉ-escolar tem de revelar uma conduta
e uma reciprocidade afectiva constantes, uma auto-estima equilibrada e
uma auto-suficiência acrescida, uma sociabilização
com os parceiros e com os adultos, uma competência lúdica
inexcedível com respeito por regras e normas, etc..
A criança em idade prÉ-escolar,
momento crucial do seu desenvolvimento, tem de manejar impulsos, de modular
frustrações, de produzir iniciativas sociais, de resolver
conflitos, de controlar e administrar emoções, numa palavra
tem de exibir uma inteligência emocional antes de pilotar
a sua inteligência simbólica. Para que seja possível
intervir neste domínio tão subtil do desenvolvimento da
criança, não se pode esquecer que o racio crianças/educadora
não pode ultrapassar a cifra de 15/1.
A construção da vida
mental na criança em idade prÉ-escolar deve ter em conta
que para pensar ela precisa de sentir, uma dicotomia perene que jamais
abandonará na sua evolução, daí que as aprendizagens
naquele momento tenham de ter em conta o papel das emoções
na evolução dos processos psiquícos das aprendizagens
simbólicas.
Como o cÉrebro cresceu de baixo
para cima em termos filogenÉticos (FONSECA 1989), tambÉm
em termos ontogenÉticos, a criança precisa de aprender com
o cÉrebro primitivo e o cÉrebro emocional.
Com o primeiro, dito reptiliano, centrado
no tronco cerebral e no cerebelo, a criança mobiliza as funções
vitais básicas para a aprendizagem (exº: respiração,
metabolismo, atenção, etc.).
Com o segundo, dito paleo-mamífero,
centrado no sistema límbico, no hipocampo, na amígdala e
nos centros emocionais, a criança mobiliza as funções
motivacionais básicas para mobilizar as estratÉgias e os
investimentos de segurança e conforto para aprender (exº: interacção
afectiva, comunicação, sentimentos de prazer, memórias,
etc.).
Sem tais disposições,
o neocórtex - o cÉrebro cognitivo - dito neomamífero,
não funciona adequadamente e as aprendizagens simbólicas
não se desabrocham na criança, e consequentemente, as suas
aprendizagens simbólicas, da leitura, da escrita e do cálculo,
não se desenvolvem eficazmente.
A criança aprende
com o cÉrebro, mas com três cÉrebros integrados num
todo dinâmico como acabámos de ver, como orgão mais
organizado do organismo ele só pode aprender quando são
respeitadas as propriedades sistÉmicas do seu funcionamento.
Será que podemos ter
esta informação miníma, não para nos substituirmos
aos neurologistas e aos psicólogos, mas como educadores perceber,
de facto, que sem tal maturação neurológica a aprendizagem
não de efectua?.
A criança prÉ-escolar
tem que ter uma mielinização, uma sinaptogÉnese,
uma migração neuronal e uma maturação das
zonas crossomodais para conseguir ler, escrever, contar e pensar, porque
sem essa arquitectura neuronal ela não vai conseguir captar informações
com a visão, associar e compreender com a audição,
integrar e sentir com as estruturas tactilo-quinestÉsicas e depois
elaborar e exprimir informações com a estrutura verbal ou
motora (práxica), para poder aprender (FISHER et al. 1991).
3. – Algumas Reflexões Práticas
para a Criança em Idade PrÉ-Escolar
Todos estes aspectos naturalmente
vão ter que exigir da parte das educadoras competências de
observação ou de diagnóstico com recurso a modelos
muito simples ("screening devices" - modelos de identificação
precoce), com a finalidade de detectar problemas desviantes que a
criança possa revelar na área socio-emocional, na área
psicolinguística, na área psicomotora e na área cognitiva.
Com recursos a escalas de prontidão
(MASLAND & MASLAND 1988) relativamente simples, podemos detectar e
ter condições de encaminhar as crianças para programas
de compensação evolutiva e proporcionar na educação
prÉ-escolar as tais condições de igualdade de oportunidades
e de materialização da democracia cognitiva.
Não basta como medida de democracia
educacional, generalizar a educação prÉ-escolar,
É urgente pôr em prática tambÉm, uma democracia
cognitiva que permita a todas as crianças aprender a ler, a
escrever e a contar de forma a que elas se adaptem com mais facilidade
a uma sociedade da informação em mutação tecnológica
acelarada..
Dentro das necessidades-chave
que acabámos de analisar, podemos afirmar de uma maneira consensual,
que a criança vai ter que desenvolver um conjunto de aquisições
ou competências,que são a transição para ela
aprender com êxito e com prazer, porque a aprendizagem sem prazer
e segurança pode constituir um processo complexo de relação
dela com o mundo exterior, e dela com os companheiros e com a própria
família.
As dificuldades de aquisição
de tais competências na educação prÉ-escolar
podem redundar em Dificuldades de Aprendizagem (DA), muitas delas
indutoras de bloqueios emocionais e cognitivos que podemos observar em
muitas crianças no 1º ano de escolaridade do ensino regular (MYKLEBUST
1972-1983).
Não se tratam de crianças
com potenciais de aprendizagem inferiores às outras, apesar de
terem diferenças culturais, como podem ser exemplo as crianças
desfavorecidas ou oriundas de culturas diferentes como as de Cabo-Verde,
da GuinÉ ou mesmo crianças ciganas.
Não se pode evoluir do princípio
que essas crianças, à partida, já estão condenadas
ao insucesso escolar e social. É de facto um erro extremamente
grave, e uma medida de segregação subtil e de exclusão
social velada, estigmatizar crianças com necessidades educativas
especiais (NEE), sem adopar uma educação prÉ-escolar
consentânea com as necessidades evolutivas que acabámos de
apresentar, pois não as respeitando tais dificuldades de desenvolvimento
podem-se repercutir de forma mais negativa no processo de aprendizagem
da criança (VAUGHN & BOS 1988).
Provavelmente nestas idades as diferenças
inter-individuais são mais evidentes do que noutros períodos
de desenvolvimento e, É muito importante que se identifiquem cedo,
porque uma DA com 3,4 ou 5 anos pode ser melhor superada com uma intervenção
compensatória precoce, habitualmente mais eficaz do que aos
8 ou 9 anos quando a criança já tem uma maturação
neurológica menos flexível e uma estrutura mais complexa
de resistências emocionais, uma impulsividade e uma inatenção
mais aprendidas, mais problemas de descontrolo e de hiperactividade, etc.,
que podem no seu conjunto tornar mais difícil a sua integração
numa sala de aula mais tarde, porque não deixa que as outras crianças
aprendam, nem que ela possa aprender normalmente.
Daí a importância de
modelos clínicos para a educação prÉ-primária,
modelos que possam considerar a importância da individualização,
da diferenciação psicológica que cada criança
possui, encarando o seu processo de aprendizagem como um processo complexo,
complexidade essa de competências clínicas, que devem ser
tomadas em consideração no plano de formação
das educadoras que actuam com crianças de 3,4 e 5 anos (JOHNSON
& MYKLEBUST 1967, MYKLEBUST 1974, 1976).
Defendemos tambÉm a ideia da
importância de uma educação de pais porque
todos nós provavelmente precisamos de ser melhores pais e melhores
mães. Não podemos estar convencidos que o domínio
do conhecimento que temos como pais É suficiente e que não
há mais nada a aprender nesse contexto tão essencial da
nossa sociedade.
Em termos básicos, diremos
que na visão piagetiana há uma construção
de processos, há uma construção que É simultaneamente
da criança e das pessoas que estão à sua volta e
da comunidade onde ela está inserida, essa co-construçao
evolutiva (VALSINER 1988) É fundamental para que seja exactamente
uma maturação que ocorre de dentro para fora, para a criança
tirar o maior benefício possível das situações
e das oportunidades que são criadas em termos escolares no dia-a-dia.
Essa inclusão na educação
prÉ-escolar tem que envolver uma integração tónica
e postural na criança, daí a importância dos espaços
dentro e fora das salas de aula.
Não basta ter espaços
escolares com uma estrutura ecológica enriquecida e a criança
não conseguir explorar o minímo dessas condições.
Como É que nós vamos ter uma orientação meramente
centrada nos espaços sem considerar as necessidades psicomotoras
da criança? Temos provavelmente de ter uma dimensão mais
equilibrada entre o meio envolvente e a criança, e É nesse
equilíbri,o que podemos organizar o material pedagógico
como sistema ecológico que facilite o surgimento de desenvolvimento
harmonioso.
Como É que podemos introduzir
condições de enriquecimento ecológico em todos os
materiais e espaços para promover na criança as tais competências
de aprendizagem?
Teremos tambÉm que entender
o papel do sistema ecológico escolar em toda as suas facetas, desde
o lápis, ao caderno, desde o livro às tecnologias de informação
e comunicação, etc.. A dimensão ergonómica
que tais materiais e equipamentos colocam, na sala de aula ou no seio
do espaço familiar, são hoje de importância capital
para promover as necessidades de desenvolvimento.
Teremos de perceber que a mudança
(aprendizagem) na criança É simultaneamente uma mudança
que se estabelece fora dela, ou seja, no seu contexto envolvente. Os agentes
que criam formas inteligiveis de interacção entre a criança
e os seus ecossistemas tendem a produzir nelas processos de aprendizagem
e funções psíquicas superiores mais integradas porque
obedecem às suas necessidades de desenvolvimento.
Qual a importância dos ecossistemas
na integração sensorial, no desenvolvimento do sistema vestibular
e das funções proprioceptivas? O ensino tradicional quase
todo virado exclusivamente para as funções exterocecptivas
como a visão e a audição, negligenciam substancialmente
as necessidades psicomotoras da criança prÉ-escolar.
Ainda hoje, depois de Montessori,
a educação prÉ-escolar utiliza pouco a modalidade
sensorial tactilo-quinestÉsica, poucas educadoras não fundamentam
teoricamente o papel desta dimensão na evolução da
criança. Nem mesmo Piaget foi longe em relação a
esta implicação sensório-motora no desenvolvimento
psíquico da criança.
Tais condições do
sentir entendidas como prÉ-requisitos da organização
neurológica da aprendizagem, verdadeiras prÉ-aptidões
que permitem depois ler, escrever e contar, e torná-la agradável
e prazeirosa, vão gerar a significação da experiência
(o "insight") na criança prÉ-escolar, com a qual se estabelecem
as redes neuronais que representam a própria realidade simbólica
posterior. Existem imensas crianças que apesar de serem inteligentes,
com um quociente intelectual (QI) mÉdio e acima da mÉdia,
têm dificuldades na leitura,na escrita e no cálculo, exactamente
porque estão tactilo-quinestesicamente e corporalmente privadas
(ROURKE 1989, 1993).
Muitas figuras importantes e que deram
um grande contributo em muitas actividades científicas e artísticas,
apresentavam DA na sua infância, como Einstein, Rockfeller, Rodin,
Picasso, W. Dysney, Caruso, etc., com uma adequada identificação
precoce e com programas de intervenção adequados às
suas necessidades, transformaram-se em personalidades extraordi-nárias
como adultos.
O problema das DA deve partir portanto
de uma visão global, dinâmica e optimista do desenvolvimento
da criança para conseguir actuar a tempo, por isso a educação
prÉ-escolar pode ser um meio privilegiado da sua prevenção,
e por meio dele reduzir substancialmente a percentagem exagerada de insucesso
escolar ou de DA no ensino do 1º ciclo e do 2º ciclo.
Certamente que o problema É
mais do que um fracasso da criança, porque nós apontamos
o indicador da nossa mão para ela, mas esquecemos que temos os
dedos mÉdio, anelar e mínimo a apontar para nós,
talvez a lembrar, em sentido figurado, a falta de intencionalidade, significação
e transcendência que requer o acto pedagógico, a falta de
estratÉgias de instrução e de mediatização,
a falta de modelos de avaliação mais centrados nas necessidades
das crianças, etc.
Provavelmente isso quer dizer que
temos que mudar os currículos, a interacção educadora-criança,
os processos de ensino-aprendizagem, etc., para mobilizar as sete inteligências
da criança (GARDNER 1985), para optimizar e maximizar as condições
de desenvolvimento e de aprendizagem, nomeadamente: a integração
postural, a integração sensorial, a integração
motora, a integração somatognósica, a integração
espacial, e só depois, a integração simbólica.
Quer dizer que a aprendizagem simbólica
necessária às aprendizagens básicas tradicionais,
ilustra em certa medida, uma neuro-montagem integrada de sub-competências
e de competências multifacetadas e multideterminadas que envolvem
a construção equilibrada duns sistemas funcionais sobre
outros. Se se passar muito depressa por aquisições que são
o suporte de outras mais elevadas, muito provavelmente as dificuldades
vêm a surgir mais à frente.
Inúmeras pesquisas de crianças
prÉ-escolares em risco são unânimes em considerar
um conjunto de prÉ-aptidões para a aprendizagem escolar,
nomeadamente nas componentes que temos vindo a referir.
APPELTON, CLIFTON e GOLDBERG 1975,
numa investigação original com base em escalas de identificação
precoce e em estudos longitudinais, chegaram à seguinte lista de
prÉ-aptidões de prontidão ("readyness skills") para
as aprendizagens escolares:
- PrÉ-aptidões Cognitivas:
atenção (persistência, curiosidade e exploração);
percepção (captação de estímulos e
observação sistemática); e conceptualização
(antecipação, sequencialização, estratÉgias
de resolução de problemas e de aquisição de
conhecimento);
- PrÉ-aptidões Psicomotoras
(controlo postural e manipulação);
- PrÉ-aptidões Psicolinguísticas
(comprensão e utilização dos sistemas de linguagem);
e finalmente,
- PrÉ-aptidões Sócio-Emocionais
(auto-suficiência na higiÉne e na nutrição),
independência, interacção com adultos, auto-estima,
inibição de comportamentos impulsivos, flexibilidade e condutas
de cooperação).
Muitasm dificuldades e problemas de
aprendizagem de leitura, de escrita e de cálculo, emergem exactamente
porque não se desenvolveram a tempo os prÉ-requisitos das
competências fundamentais de aprendizagem.
Aquelas que constituem as competências
simbólicas, certamente que dependem das competências prÉ-simbólicas
(FOSS 1991) que devem constituir os objectivos de todo o processo de evolução
da educação prÉ-escolar, onde deverão ter,
de facto, um maior enfoque no seu desenvolvimento.
De uma forma didáctica precisamos
de conhecer que a criança quando chega à educação
prÉ-escolar tem 3 anos de história pessoal. O que se passa
nesses 3 anos de história evolutiva, É muito importante
para o desenvovilmento do potencial de aprendizagem da criança
em idade prÉ-escolar. Da mesma forma, É extremamente importante
o desenvolvimento intrauterino durante 9 meses no caso do recÉm-nascido.
A criança em termos históricos
tem de aprender primeiro reflexos na "barriga da mãe" (ventre biológico),
posturas, práxias e emoções na "barriga da família"
(ventre psico-afectivo), e só depois aprende símbolos na
"barriga da sociedade" (ventre sócio-cultural), porque a prÉ-estrutura
do seu cÉrebro assim o determina.
Se não se nasce com bons reflexos,
nem se aprende posturas e práxias, emoções e sentimentos,
depois aos 12 anos na adolescência, não se pode atingir a
reflexão. Para ir dos reflexos à reflexão É
uma dÉcada de intervenção intencional dos adultos
sobre a criança, porque ela abandonada depois do nascimento, não
pode por si próprio desenvolver funções simbólicas.
A aprendizagem humana subentende uma transmissão cultural transgeracional,
como evocou VIGOTSKY 1962.
A inteligência superior humana,
só É possível num contexto social e histórico.
A criança não pode ficar abandonada na aprendizagem, a criança
tem de beneficiar da interacção de seres humanos mais experientes
para produzir todo o seu potencial simbólico, É esse o sentido
da "zona de desenvolvimento proximal" vigotskyana. Sozinha tem um tipo
de desenvolvimento, com a ajuda mediatizada dos adultos, a criança
pode atingir um nível de expressão cognitiva muito mais
elevado (VIGOTSKY 1978).
A criança no 2º ano de vida
tem de revelar segurança gravitacional, quer dizer, tem que de
equilibrar muito bem o seu corpo na gravidade, que É um sistema
que actua em todos os objectos deste planeta, tem que estar bem apoiada
e com os "pÉs na terra". PorÉm há muitas crianças
no período da educação prÉ-escolar, que ainda
não estão com os pÉs na terra e por isso quando se
vê uma criança com dificuldade na leitura e na escrita, com
7 e 8 anos e estudamos o equilíbrio dela com os olhos fechados,
ficamos pasmados como o seu corpo todo oscila em roturas posturais com
uma grande dificuldade em controlar o seu corpo que É o centro
de integração de toda a informação (FONSECA
1975, DAMáSIO 1995).
A criança prÉ-escolar,
tem que ter movimentos binoculares com os olhos para focar o fixar dados
de informação, tem que ter um bom controlo postural, uma
excelente organização psíquica e eintencional da
sua motricidade global e fina (FONSECA 1995).
Se a criança não tiver
um perfil psicomotor intacto como É que ela vai explorar
os espaços lúdicos ("play grounds"), como É que ela
vai ter competências para explorar brinquedos ou objectos, indispensáveis
ao seu desenvolvimento integral.
Para tirar proveito das aprendizagens
simbólicas, a criança prÉ-escolar deve dispôr
de competências não-simbólicas, de funções
básicas de auto-suficiência, de conforto táctil e
quinestÉsico do seu corpo e do seu Eu (FREUD 1930, 1962), para
que os produtos da sua integração sensório-motora
possam suportar com robustez as exigências neurofuncionais das aprendizagens
escolares.
Sem a essência do sistema
psicomotor humano (FONSECA 1989, 1995) sem uma óptima coordenação
oculo-manual, sem um bom nível de percepção visual,
sem um bom poder grafomotor, sem uma boa capacidade da mão ser
o perifÉrico da inteligência, a criança não
estará apta, nem tem relações equilibradas com os
seus colegas, nem interage de forma harmoniosa com o processo da aprendizagem.
A criança tem que dispor de
uma excelente organização da sua imagem corporal,
que É fundamental, não só no desenho, como na representação
e projecção no espaço e conseguir relacionar o espaço
fora do corpo com o espaço dentro do seu corpo. Essa fronteira
vai criar a noção do eu e do não eu (SPERRY 1979,
SCHILDER 1963). Por falta desta aquisição sócio-emocional
essencial à aprendizagem, há muitas crianças com
problemas socio-emocionais com muitas dificuldades de aprendizagem e com
baixo nível de frustação, donde emanam grandes problemas
de irritabilidade e impulsividade. Por via destas disfunções,
os seus rendimentos escolares são baixos, não porque a sua
inteligência É restrita, mas por as estruturas cognitivas,
psicomotoras, psicolinguísticas e sócio-emocionais estão
fragilizadas.
Para aprender com facilidade, a criança
prÉ-escolar tem que ter coordenação manual bilateral,
têm que ter uma boa dominância na mão, na visão,
na audição e no pÉ. Toda esta dominância sensório-motora
reflecte uma especialização hemisfÉrica sem
a qual as aprendizagens escolares se podem assimilar dinamicamente (KIMURA,
1973, GUBAY 1975, DENNIS & WHITAKER 1977, HEILMAN & VALENSTEIN
1979, LEVY 1980, QUIRóS & SCHRAGER 1985). A criança
sem especialização hemisfÉrica não vai aprender
a ler, a escrever e a contar no 1º ano de escolaridade. Muitas crianças
portadoras de deficiência mental, são caracterizadas exactamente
pela ausência de dominância hemisfÉrica com a qual
recebemos, integramos, elaboramos e comunicamos informação
simbólica.
TambÉm o nível de actividade
e o nível de atenção dependem desta organização
não-simbólica básica que temos vindo a abordar
(KOPPITZ 1971, ROURKE 1989, FONSECA 1975, 1987, 1994;). Para aprender
a criança em idade prÉ-escolar tem que ter um nível
de atenção hiper-estruturada, para conseguir captar e extrair
estímulos relevantes e não perder tempo, nem desconcentrar-se
ou ficar distraída com informações que são
irrelevantes.
Se a criança não tiver
essa atenção ao nível da visão, da audição
e do seu corpo quinestÉsico, ela está na sala de aula e
está permanentemente a ser atraída por sons e por sinais
que estão fora do contexto da aprendizagem, por esse facto, ela
apresenta problemas de processamento de informação e não
aprende (DOUGLAS & PETERS 1979).
Uma criança hiperactiva
É uma a criança hipo-organizada em termos de aprendizagem.
Temos que ter muita preocupação com estas crianças,
dado que podem depois, numa situação de aprendizagem mais
complexa, ter muitas dificuldades de inibição, de assimilação
sinais dentro do seu próprio corpo para poder depois orientar,
seleccionar, processar e transmitir a sua actividade mental e para responder
às situações de aprendizagem (McCARTHY & McCARTHY
1974).
A criança tem que ter uma estabilidade
emocional para conseguir atingir rendimento na educação
prÉ-primária, trata-se de um diploma como qualquer outro,
ela tem que obter à entrada do 1º ano de escolaridade, um nível
de maturação adequado nas várias componentes da aprendizagem.
Para alÉm destas competências
que estamos a focar a criança deve entrar no ensino dito primário,
com as condições de prontidão que permitem uma aprendizagem
normal, ela tem que ter organização, concentração,
auto-estima, auto-confiança, auto-controlo, capacidade de aprender
a aprender, isto É, um processamento de informação
intacto e flexível, ter que ter funções de input,
de integração, de elaboração e de output e
tem que ter consciência metocognitiva, consubstanciando uma dinâmica
neuro-funcional sem a qual não pode aprender (SPEECE & COOPER
1990).
Em síntese, o que fazem as
educadoras e todos os que trabalham com crianças dos 3 aos 6 anos,
É uma obra de transcendência impressionante, e não
uma mera resposta a necessidades sociais e familiares.
Cabe-lhes criar as condições
para que as crianças, o maior capital dum país, possam ter
direito à cidadania numa sociedade de informação.
Bem hajam por esse esforço,
mas atenção essa obra tem que envolver uma maior qualidade
pedagógica e uma profunda cientificidade da acção
educativa, só alcançável com uma licenciatura, porque
trabalhar com crianças em idade prÉ-escolar É provavelmente
mais complexo do que trabalhar com estudantes universitários.
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